“Na América é o pai Natal… É como é hoje em dia aqui – aquelas árvores bonitas, ruas enfeitadas, que antigamente não existia”, conta Maria Helena Goulart de 67 anos, natural de Santo Amaro, que emigrou para os Estados Unidos com 24. Realça que quando foi para a América “já havia uma pequenina coisa aqui, mas não era como hoje em dia – hoje parece a América!”
“Mas não parece em tudo”, completa Fátima Melo, 70 anos, “porque lá tem muita luz, muito snow”. Fátima ficou por Santo Amaro, mas tem muitos parentes emigrados.
Neste Natal, a Câmara de São Roque do Pico convidou alguns munícipes a falar sobre um Natal que se fazia ao calor de um forno de lenha, com um candeeiro a óleo, no regaço de outros tempos.
Palavras como sustentabilidade, comunidade e união, que estão na ordem no dia, sintetizam os testemunhos dos nossos anciães.
“O Natal começou por ser uma tradição pagã”, explica o Padre Júlio Rocha, “o solstício de Inverno era celebrado em Roma com o culto ao Deus Sol, depois os cristãos consideraram que Jesus Cristo era a nossa luz, então passou a celebrar-se o nascimento de Jesus nessa altura”.
“Meu pai chegava com o ‘galhinho’ de pinheiro, sempre… Estou vendo-o a entrar pelo portão adentro… – relembra Alda Caldeia, 67 anos, natural de São Roque – “Não se cortava um pinheiro pela cepa porque o pinheiro servia para dar madeira. Às vezes era um galho muito escangalhado, mas agente consertava”. “As bolas de Natal eram feitas pela minha mãe com casca de ovo – fazia-se dois buraquinhos, soprava-se e saía a gema e a clara – ela pintava caras com lápis de cor, e fazíamos com algodão os cabelos”.
À refeição comia-se carne, era das poucas vezes que o alimento era servido, “juntavam-se uns quantos amigos, matavam uma vaca e dividiam. Cada um levava um tanto daquela vaca para fazer pelo Natal. Não comíamos a molha de Natal na véspera antes de irmos para a missa do galo; era no outro dia, mas meu pai chegava e antes de se deitar ia provar a molha”, explica Alda.
“Agente também nunca se esquece da molha do Natal antiga. Faço sempre outras coisas, mas a minha molha de Natal eu nunca esqueci”, garante Maria Helena Goulart.
Sobre os presentes, Maria Helena tem uma história para contar: “Um dia vi numa loja uma carteirinha e disse à minha mãe que gostava dela, e ela respondeu:
– Se fores boazinha o menino Jesus vai-ta trazer!
Mais tarde, por acaso, fui procurar não sei o quê numa gaveta de uma mesa e vi a carteirinha. Fechei logo a gaveta e nunca disse à minha mãe.
No dia de Natal à noite fomos à missa do galo, à meia noite, e eu pus o meu sapatinho à porta do forno – um lar ferrugento, com um buraco em cima, em vez da chaminé, de onde saía o fumo.
Quando vim da Igreja fui, de carreira, ao sapatinho ver se o menino Jesus me tinha trazido alguma coisa e vi lá a dita carteirinha! E eu fui assim, muito depressa:
– Oh mãe como é que o menino jesus sabia que estava aquela carteirinha naquela gaveta e pôs-ma aqui?
E ela vai:
– O menino Jesus vê tudo!
– E como é que ele entrou?
– Foi por aquele buraquinho.
– E ele todo vestidinho de branco, como é que ele não ficou sujo de ferrugem?
E ela vai:
– Oh filha, o menino Jesus está preparado, tem uma capa que bota por cima e entra em qualquer chaminé ou lugarinho para ir levar o presente!
E eu fiquei toda feliz.”
“O Natal antigamente era muito diferente do que é agora, não há comparação possível”, sublinha Maria Luísa Gomes, 75 anos, natural de São Roque.
“Na altura dos meus filhos, o pai era muito habilidoso – fazia o presépio, umas casinhas… – tinham umas prendinhas, embora não fosse como agora. Era o menino Jesus! Antigamente não se falava no Pai Natal.”
“Lembro-me do Rui e do António pedirem uns carrinhos de bois feitos em madeira, foi a prenda de Natal do menino Jesus.”
“A Ilda e a João receberam umas bonecas, ficaram tão felizes, tão felizes que até correram para a Igreja pedir ao senhor padre para batizar as bonecas.”
“Não havia o desperdício que há agora, as pessoas faziam o Natal com o que tinham, próprio de casa – era mais saudável. Havia mais ligação entre as famílias do que há agora, juntavam-se e visitavam-se uns aos outros no Natal.”
“O Natal transformou-se numa época de consumismo”, realça Neide Alvernaz, Técnica Superior de Saúde Ambiental na Câmara. “Parece que a preocupação é que os presentes estejam todos comprados. Há pouca preocupação em juntar famílias e em promover o convívio e a partilha – o verdadeiro significado do Natal”.
Para Neide Alvernaz é necessário ter em conta a quantidade de papel utilizada e o recurso a plásticos, que não são biodegradáveis, tanto nas decorações como nos presentes. A Técnica sensibiliza para a compra de presentes feitos de materiais naturais.
Ao nível da confeção da comida, é importante preferir os alimentos locais, que têm uma menor pegada ecológica. As quantidades devem ser feitas com peso e medida, pela saúde e porque estamos numa altura em que o Planeta Terra vive acima da sua capacidade de regeneração.
A Câmara de São Roque do Pico deseja a toda a comunidade um Natal de união, partilha e sustentabilidade!
2019-01-04 10:26:20
CMSRP